29 de junho de 2009

O contemporâneo mundo do trabalho

Por Willian Luiz da Conceição

Segundo a pós-modernidade, o mundo do trabalho não existe mais, assim como afirmam que após a queda do muro de Berlim e o fim da União das Repúblicas Socialistas e Soviéticas (URSS) chegamos no que denominam “o fim da história”.

Obviamente que classe trabalhadora possui novos traços, especificidades, necessidades e características diferentes daquelas dos séculos passados. Ainda hoje a classe trabalhadora obtém no planeta papel fundamental, compreendendo a grande totalidade dos que vendem a sua mão-de-obra, mulheres, crianças, homens e idosos.

Aos longos de nossas décadas os trabalhadores manuais, fabris, industriais e especializados vem passando por um processo de desarticulação e reducionismo, fortalecido pelas transformações ocorridas nos sistemas Fordista/Toylorista, pela restruturação do capital e flexibilização/desregulamentação do trabalho formal. Isso só reflete o momento complexo em que passa o mundo contemporâneo do trabalho.

Se ainda dentro desta complexidade a classe trabalhadora não é mais a mesma dos séculos passados, seu desaparecimento não é evidenciado. Sendo que a classe trabalhadora consiste hoje a totalidade dos assalariados, homens e mulheres que vivem da venda da sua força de trabalho – classe que vive do trabalho, conforme denominação também utilizada por Ricardo Antunes em Adeus ao trabalho?” e “Os sentidos do trabalho”, de 1995 e 1999, ou seja aqueles despossuídos de qualquer meio de produção.

O proletário clássico, resultado dos modelos Fordista/Toylorista, passa por uma constante diminuição numérica, acelerada pela restruturação do sistema produtivo do capital, cedendo lugar a novas formas de trabalho, principalmente desregulamentados, instáveis e informais. A transformação da linha de produção, sua explanação e flexibilização física, associado ao avanço da máquina informatizada tem contribuído para a diminuição do proletariado industrial, fabril, clássico, estável e especializado.

Com a diminuição do proletariado formal, esse dá lugar aos trabalhadores terceirizados, característica de trabalho baseado ainda mais no subemprego, na sub-exploração e flexibilização dos direitos trabalhistas conquistados historicamente pelos trabalhadores dentro e fora do Brasil. Esse trabalho antes garantido pela mão-de-obra dos imigrantes, principalmente nos países centrais como Alemanha, com os gastarbeiters, hoje arrastam trabalhadores(as) industriais formais clássicos para o mundo do trabalho terceirizado, temporário, ainda mais precarizado, ou para setores de serviço, já consolidados principalmente na Europa e que avança em países de periferia, como o Brasil. Lembrando que o Brasil, principalmente no final da década de 70, passa por um grandioso crescimento na formação do proletariado industrial e fabril, diferente do momento atual agravado pela crise no sistema de reprodução de capital que passamos e pela falta de política do Governo Lula, que lança diariamente milhares de trabalhadores(as) também no desemprego.

Outra característica que podemos perceber na transformação no mundo do trabalho e o significativo aumento da força de trabalho feminina, principalmente na ultima década, obtendo dados astronômicos em países de economia central, ultrapassando 50% da mão-de-obra explorada. Nos países de periferia, como o Brasil, não é diferente. Ainda assim, a temática salarial e a remuneração média das mulheres é inferior a dos homens, assim como os direitos sociais e trabalhistas na prática. Os estudos sobre divisão sexual do trabalho apontam que as atividades de capital intensivo são realizadas predominantemente pelos homens, ao passo que aqueles de maior trabalho intensivo, frequentemente com menores níveis de qualificação, são preferencialmente destinadas às mulheres, também a trabalhadores(as) negros(as), indígenas, como afirma também Helena Hirata em seus escritos intitulados “Nova divisão sexual do Trabalho?”.

Temos ainda um forte crescimento no setor de serviços, aqueles(as) trabalhadores(as) que se desempregam do mundo fabril e industrial, passam a muitas vezes para essa categoria de trabalho. É fundamental pensarmos que passamos por um processo de mutação organizacional, tecnológica e de gestão, sendo que esta também afeta o mundo do trabalho nos serviços, cada vez mais se submetendo à falta de racionalidade do capital e à lógica do mercado, buscando a liberação total do mesmo, assim como diminuição do Estado a partir principalmente das privatizações e sucateamento dos serviços públicos. Essa política, intitulada de neoliberalismo, nascente no inicio da década de 90, e que fracassa na crise desencadeada em fins de 2008.

Outra influência da transformação no mundo do trabalho é a exclusão dos jovens e idosos do mercado de trabalho, que, cada vez mais sem perspectiva de emprego, acabam sendo jogados nas fileiras dos trabalhos precários ou do desemprego. Sem perspectivas de trabalho, dada a consolidação do desemprego estrutural agravado pela crise e por falta de políticas de estatização de empresas, sistemas financeiros falidos e também de combate à flexibilização dos direitos trabalhistas. Podemos também perceber o aumento substancial de mão-de-obra infantil no mercado de trabalho, de forma precoce e criminosa, principalmente como característica da estrutura agrária brasileira baseada no latifúndio e no agronegócio.

Outra tendência que cresce, resultado de tais mudanças, é o chamado “Terceiro Setor”, que busca assumir uma alternativa de trabalho, através de empresas de imagem mais comunitária, com base em trabalho voluntário, envolvendo um amplo setor de atividades, nas quais predominam o caráter assistencial, “sem fins” lucrativos e que se desenvolvem relativamente à margem do mercado. O avanço deste segmento é um desdobramento da retração do mercado de trabalho industrial e de serviços, do aumento do desemprego. Está forma de atividade, é movida principalmente pelas Organizações Não Governamentais (ONGs). Essa alternativa é extremamente limitada para compensar o desemprego estrutural, não se constituindo numa alternativa efetiva e sólida ao mercado de trabalho capitalista. O “Terceiro Setor” acaba exercendo um papel de contribuindo (um papel de contribuindo?) com o mercado, uma vez que incorpora trabalhadores desempregados pelo capital. Se esse segmento atua à margem da lógica do mercado é um problema, pois busca salvar o sistema e tampa os furos do Estado e das políticas neoliberais no serviços sociais.

A descaracterização do trabalho clássico, assim como do proletariado industrial, é parte destas mudanças no sistema de produção e fruto dela. Não se trata da morte do trabalho, mas é fato que o proletariado muda seu biótipo a cada avanço do trabalho informal, assim como vem ocorrendo com a expansão do emprego à domicílio e o trabalho na louca expansão da teleinformática, cada vez mais mundializada e avançada com a transnacionalização do trabalho, confundindo e utilizando diferentemente os trabalhos locais, regionais, nacionais e internacionais de forma a distanciar as várias etapas de sua produção, contribuindo que o novo proletário tenha muitas faces e características nesse imenso mundo do trabalho. Isso beneficia a hegemonia cultural burguesa (individualista, mesquinha e insana) sob a sociedade, facilitando que os trabalhadores passem por um processo de aburguesamento.

Também para Ricardo Antunes, sociólogo do trabalho, “é este, portanto, o desenho compósito, diverso e heterogêneo que caracteriza a nova conformação da classe trabalhadora, a classe-que-vive-do-trabalho: além das clivagens entre os trabalhadores estáveis e precários, homens e mulheres, jovens e idosos, nacionais e imigrantes, brancos e negros, qualificados e desqualificados, “incluídos e excluídos” etc., temos também as estratificações e fragmentações que se acentuam em função do processo crescente de internacionalização do capital”.

Hoje entender o proletariado é buscar compreender um ambiente muito mais amplo, incluindo neste grupo não mais só os trabalhadores manuais, industriais e clássicos, mas sim incluir toda essa força humana, homens, mulheres, idosos, negros, índios e crianças, assim como os trabalhadores rurais, tendo em vista a expansão do capital no campo. Pensar no proletariado contemporâneo é abrigar a totalidade dos que vendem sua força de trabalho, não possuem meios de produção. Cabe o desafio aos diversos grupos que pensam o mundo do trabalho – sejam aqueles que buscam a superação da lógica desumana de reprodução do capital e até mesmo os que legitimam, justificam e sobrevivem desta lógica de exploração – entender o proletariado como uma classe muito mais ampla, fragmentada e heterogênea. Esse desafio se compreende ainda maior em tempos de crise, pois é nesse momento que as contradições estão mais aparente, mas não menos complexas. E como diz o velho e sábio Marx, “o Capital senhor ao mesmo tempo elegante e bárbaro, arrasta consigo para a cova os cadáveres dos seus escravos, numa verdadeira hecatombe de operários que naufragam nas crises”.

Willian Luiz da Conceição é estudante de História da Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE, militante e presidente do PSOL Joinville.

28 de Junho de 2009


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