20 de outubro de 2010

A imagem do isolamento

Hoje por poucos instantes senti a vontade de ficar sozinho

Talvez um cinema fosse um ótimo programa para ver pessoas diferentes de longe, afastadas cada um com o seu mundo

A correria dos dias tem interrompido as possibilidades de respirar fundo, de conversar sobre o mar que há tempos não enxergo, as estrelas que somem e aparecem ao anoitecer, que só dou-me conta de sua existência nas nubladas ou de chuvosas noites quando estas não se fazem presentes

A busca pelo isolamento durou poucos minutos, mais o sentimento que dele iniciou permaneceu e ainda foi incapaz de apagar-se na escuridão do fim do dia que já chegou

As ruas cobertas de gente, num fluxo constante e frio propiciaram a negação de qualquer olhar de qualquer contato de vida, de qualquer convite de café em qualquer cafeteria ao modo francês, para papear os velhos e novos assuntos desta conjuntura infame

A falta das mulheres que estiveram por aqui e agora somem como as estrelas, faz-me pensar sobre a arte, a literatura, a musicalidade, mas percebo que os sons dos gemidos desapareceram também
Ao controlar o desejo de ir ao cinema, por não ter nada aparentemente interessante que possa se considerar cultura, dentro dos conceitos mais conservadores e eurocêntricos – continuei a caminhar com a gente louca da cidade

A imagem de uma mulher nua me veio à mente, seu corpo esteticamente, padronizadamente burguesamente moldado tomou meu imaginário

Os brincos trocados nas frias e deliciosas orelhas, os colares compridos e belissimamente coloridos seriam as únicas peças que compunham seu modelito

Talvez amanha o dia renasça, com ele as pessoas estejam mais humanas eu desista da vontade de ir no cinema e me isolar, a noite aquela que das orelhas, colares e brincos trocados, possa aparecer e trazer consigo as estrelas


Willian Conceição é acadêmico de História

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