15 de fevereiro de 2010

Do Morro ao Asfalto


Por Willian Luiz da Conceição

“Quem não gosta de samba bom sujeito não é. É ruim da cabeça ou doente do pé.” Quem se atreve a dizer que não gosta de samba?

Apesar do carnaval ser uma festa de origem européia, surgida no entrudo português, festejo onde as pessoas lançavam uma nas outras, água, ovos e farinha. O entrudo ocorria em período anterior à quaresma.

Esta festa que daria surgimento a mais tradicional festa do Brasil, leia-se o carnaval, teve seu primeiro centro de influência na cultura de países europeus como Portugal, Itália, França entre outros. O entrudo teve sua inserção no Brasil no século XVII, mas vai se enraizar como expressão cultural a partir do século XIX com o surgimento dos primeiros blocos carnavalescos, cordões e corsos, levando às pessoas as ruas, todas fantasiadas e enfeitando seus carros, este ultimo dando surgimento mais tarde aos carros alegóricos.

No século XX o carnaval ganha apelo popular, dando surgimento às famosas marchinhas como “Acorda Maria Bonita, Levanta vai fazer o café”, entre outras milhares que se espalharam Brasil a fora. Estás (marchinhas) possuem características políticas e culturais influenciadas pelas mudanças sociais, políticas e econômicas que o país vive neste período histórico.

“Não deixe o samba morrer. Não deixe o samba acabar. O morro foi feito de samba”.

“Deixa Falar” foi à primeira escola de samba surgida no Rio de Jeneiro, no bairro de Estácio, apesar de seu período de vida ter sido razoavelmente curto, seus integrantes como Ismael Silva eram difusores de uma expressão musical “nova” – o samba. O samba na primeira metade do século XX teria se tornado o principal gênero da música popular brasileira, tendo neste período como principais compositores e interpretes Chico Alves, Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Cartola, entre outros.

Outras escolas de samba viriam a ser formadas a partir deste núcleo “inicial” como a Mangueira e Portela, nascidas como organização de suas comunidades onde aglutinavam-se centenas de pessoas em barracões como verdadeiros lugares de sociabilidade destas populações.
O samba nasce como sinônimo de resistência de uma população negra, oriunda das periferias dos centros urbanos como Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo difundindo-se por uma sempre maior massa popular em outros estados brasileiros. O samba se torna resistência e cultura de uma população cheia de vida, trabalhadora, marginalizada, negra e pobre dos morros brasileiros. O samba, genero musical, que se expressa atraves de ritmos e dança, de raízes africanas adaptas ao gosto e caracteristicas do criolo (negro nascido no Brasil), tornando e transformando-se em algo próprio do brasileiro e símbolo de uma certa identidade nacional.

“Apesar de eventuais preconceitos das elites intelectualizadas contra esse gênero saído dos morros cariocas, redutos dos pobres e excluídos, o mercado musical sempre conviveu muito bem com o imaginário impresso nas composições, fortemente apoiado em referências simbólicas – “o morro”, o “barracão”, a “favela” – originárias das rodas comunitárias onde eram produzidas. No final da década de 1950, contudo, esse convívio relativamente tranquilo começou a se alterar. Foi quando jovens da classe média, como Carlos Lyra, Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli, passaram a se reunir em apartamentos da Zona Sul do Rio de Janeiro para trocar idéias e propostas musicais. Não precisavam de muito. Bastavam “um cantinho, um violão”, como na música de Tom Jobim. Dispensavam a voz “impostada” dos grandes intérpretes do período e o aparato cênico que a Rádio Nacional e o cinema montavam para apresentar os novos lançamentos da MPB” Felipe Trotta.

Nascia a bossa nova como o “objetivo” de dar ao samba uma forma mais moderna “em sintonia com o desenvolvimentismo do momento político-cultural do governo de Juscelino Kubitschek. O Brasil vivenciava uma atmosfera de otimismo e de crença no futuro, e o novo gênero seria uma expressão legítima de tais sentimentos. Em vez dos antigos temas da música brasileira, falava-se agora do barquinho, do violão, do sol, do sul, do mar e do amor.”.

Em meio a outros gêneros musicais, o não desejo de modernização e mais tarde a falta de apoio do mercado, o samba se torna algo tradicional, tido por muitos como arcaico; do morro, da favela e de negro; onde seus adeptos se reunindo nos fundos de quintais tocando cavaquinho, pandeiro, cuíca, surdo e violão. Mesmo assim se torna ponto de referencia e de influencia para a formação, nem que por negação, de gêneros como a própria bossa nova, engajadas como as músicas de Chico Buarque, o movimento tropicalha, nos anos noventa do pagode, entre outros

Hoje surgem diversas criticas as escolas de samba, principalmente as do Rio de Janeiro por seu afastamento de suas determinadas comunidades, tornando o carnaval algo profissional e comercial. Milhões de reais são investidos pela prefeitura do Rio, além da comercialização previa de parte das alas para os estrangeiros.

Talvez os gêneros mesmo de contestação e mais populares sofrem com o tempo caráter mercadológico. Mesmo assim, podemos encontrar carnavais mais próximos da origem como em Florianópolis e São Francisco do Sul onde escolas são locais de referencia das comunidades que estão inseridas. Essa permanência na história e na origem do carnaval e do samba tem que resgatada, com pena da perda da identidade que se constituiu na periferia brasileira.


Willian Luiz da Conceição é acadêmico de História
Ligaspartakus@gmail.com

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