29 de janeiro de 2010

Polícia catarinense prende líderes do MST em “ação preventiva”



Por Elaine Tavares

Um dos coordenadores estaduais do MST em Santa Catarina, Altair Lavratti, foi preso na noite desta quinta-feira em Imbituba numa ação que lembra os piores momentos de um estado de exceção. Com uma força de mais de 30 policiais militares, a prisão foi efetuada no momento em que ele realizava uma reunião pública, num galpão de reciclagem de lixo da cidade.

A acusação é de que Lavratti, junto com outros sindicalistas e militantes sociais preparava uma ocupação de terras na região. Foi levado sob a alegação de “formação de quadrilha”.Segundo informações divulgadas no jornal Diário Catarinense, que estava “magicamente” no ato da prisão ao lado da polícia, os integrantes do MST estavam sendo monitorados desde novembro depois que um integrante do Conselho de Segurança Comunitária de Imbituba passou informações sobre a organização de uma suposta ocupação em terras do estado.

Outras duas pessoas também foram presas, sendo que uma delas, Marlene Borges, presidente da Associação Comunitária Rural, está grávida. Ela teve a casa cercada na madrugada de sexta-feira e foi levada para Criciúma. Outro militante, Rui Fernando da Silva Junior, foi levado para a cidade de Laguna. Integrantes do MST, advogados e um deputado estadual estiveram procurando por Lavratti durante a noite toda, mas não haviam conseguido contato até a manhã de sexta-feira, quando souberam que de Imbituba ele havia sido levado para Tubarão.


Ainda segundo informações da polícia, o juiz Fernando Seara Hinckel autorizou gravações telefônicas e determinou a intervenção do Ministério Público. Também teria havido a participação de P-2 (policiais a paisana, disfarçados) infiltrados nas reuniões dos militantes sociais da região de Imbituba.Usando de um artifício já usado contra o Movimento dos Atingidos das Barragens, que foi o de prender “preventivamente” integrantes do movimento alegando “suspeita de invasão”, o poder repressivo de Santa Catarina repete a dose agora contra o MST.

Para a polícia e para o poder público, reuniões que envolvam sindicalistas e lutadores sociais passam a ser “suspeitas” e sendo assim, passíveis de serem interrompidas com prisão. Só para lembrar, este é um tipo de ação agora muito usado nos Estados Unidos, depois de 11 de setembro, quando o presidente George Bush acabou com todas as garantias individuais dos cidadãos. Lá, e agora também aqui, o estado pode considerar suspeita qualquer tipo de reunião que envolva movimentos sociais. Conversar e organizar a luta por uma vida melhor passa a ser coisa de “bandido”.

A acusação de formação de quadrilha não encontra respaldo uma vez que é pública e notória a preocupação do MST com a situação das famílias daquela região, que vem sistematicamente tendo que abandonar a zona rural em função da falta de apoio à agricultura familiar, enquanto o agronegócio recebe generosa ajuda governamental. A reunião na qual estava Lavratti justamente discutia esta situação e levava a solidariedade do movimento às famílias que seguem sendo despejadas de suas terras, ações que fazem parte do cotidiano do MST.


A ação do governo se deve ao fato de em Imbituba ter sido criada uma Zona de Processamento e Exportações que tem engolido fatias consideráveis de dinheiro público sendo, portanto, considerada estratégica para os empresários da região.Para o MST, as prisões foram descabidas, e só reflete a forma autoritária como o governo de Santa Catarina tem conduzido a relação com os movimentos sociais, criminalizando as tentativas dos catarinenses de realizar a luta por uma vida digna. Já para dar respostas aos atingidos pelo desastre em Blumenau, ou aos desabrigados pelas chuvas que tem caído torrencialmente este ano em Santa Catarina, não há a mesma agilidade estatal.

Como bem já analisava o sociólogo Manoel Bomfim, no início do século vinte, ao refletir sobre a formação do estado brasileiro: “desde o princípio o Estado foi um aparelho de espoliação e tirania, feroz na opressão, implacável na extorsão. É um parasita”. Sempre aliado aos donos do poder e da riqueza, o Estado abandona as gentes e só existe para o mal do povo.

É por conta disso, que, conforme Bomfim, “a revolta contra as autoridades públicas é o processo normal de reclamar justiça” já que as populações são sistematicamente abandonadas pelo Estado e pela Justiça enquanto a minoria predadora dos ricos e poderosos tem seus interesses defendidos, inclusive com o uso do dinheiro e do patrimônio que é de todos.

Como exemplo disso, basta trazer à memória o escândalo da Moeda Verde, quando ricos empresários locais fraudaram laudos ambientais para a construção de grandes empreendimentos na cidade de Florianópolis. Presos sob a luz dos holofotes, não ficaram um dia sequer na cadeia e o governador do Estado segue frequentando suas festas e dizendo ao país inteiro, através da televisão, que os empreendimentos construídos a partir da fraude são os mais bonitos da cidade e necessitam ser conhecidos e consumidos.

Outro caso emblemático e atual, que não recebe a mão pesada do poder público, é o que envolve o vice-governador Leonel Pavan, enredado em escândalo de corrupção, e que também muito pouco interesse provoca na mídia. Não precisa ir muito longe para observar que Manoel Bomfim está coberto de razão: “os estadistas devem inquirir das condições sociais, indagar se as populações se sentem mais felizes e as causas dos males que ainda as atormentam, para combatê-las eficazmente”. Mas, em vez disso, lutadores do povo são presos e os direitos coletivos se perdem diante do interesse privado de uma minoria.

Elaine Tavares é Jornalista



19 de janeiro de 2010

Haiti: A maldição branca


Por Eduardo Galeano

No primeiro dia deste ano a liberdade completou dois séculos de vida no mundo. Ninguém se inteirou disso, ou quase ninguém. Poucos dias depois, o país do aniversário, Haiti, passou a ocupar algum espaço nos meios de comunicação; não pelo aniversário da liberdade universal, mas porque ali se desatou um banho de sangue que acabou derrubando o presidente Aristide.

O Haiti foi o primeiro país onde se aboliu a escravidão. Contudo, as enciclopédias mais conhecidas e quase todos os livros de escola atribuem à Inglaterra essa histórica honra. É verdade que certo dia o império que fora campeão mundial do tráfico negreiro mudou de idéia; mas a abolição britânica ocorreu em 1807, três anos depois da revolução haitiana, e resultou tão pouco convincente que em 1832 a Inglaterra teve de voltar a proibir a escravidão. Nada tem de novo o menosprezo pelo Haiti. Há dois séculos, sofre desprezo e castigo.

Thomas Jefferson, prócer da liberdade e dono de escravos, advertia que o Haiti dava o mau exemplo, e dizia que se deveria “confinar a peste nessa ilha”. Seu país o ouviu. Os Estados Unidos demoraram 60 anos para reconhecer diplomaticamente a mais livre das nações. Por outro lado, no Brasil chamava-se de haitianismo a desordem e a violência. Os donos dos braços negros se salvaram do haitianismo até 1888. Nesse ano o Brasil aboliu a escravidão. Foi o último país do mundo a fazê-lo.

O Haiti voltou a ser um país invisível, até a próxima carnificina. Enquanto esteve nas TVs e nas páginas dos jornais, no início deste ano, os meios de comunicação transmitiram confusão e violência e confirmaram que os haitianos nasceram para fazer bem o mal e para fazer mal o bem.

Desde a revolução até hoje, o Haiti só foi capaz de oferecer tragédias. Era uma colônia próspera e feliz e agora é a nação mais pobre do hemisfério ocidental. As revoluções, concluíram alguns especialistas, levam ao abismo. E alguns disseram, e outros sugeriram, que a tendência haitiana ao fratricídio provém da selvagem herança da África. O mandato dos ancestrais. A maldição negra, que empurra para o crime e o caos.
Da maldição branca não se falou.

A Revolução Francesa havia eliminado a escravidão, mas Napoleão a ressuscitara: - Qual foi o regime mais próspero para as colônias? - O anterior. - Pois, que seja restabelecido. E, para substituir a escravidão no Haiti, enviou mais de 50 navios cheios de soldados. Os negros rebelados venceram a França e conquistaram a independência nacional e a libertação dos escravos. Em 1804, herdaram uma terra arrasada pelas devastadoras plantações de cana-de-açúcar e um país queimado pela guerra feroz.

E herdaram “a dívida francesa”. A França cobrou caro a humilhação imposta a Napoleão Bonaparte. Recém-nascido, o Haiti teve de se comprometer a pagar uma indenização gigantesca, pelo prejuízo causado ao se libertar. Essa expiação do pecado da liberdade lhe custou 150 milhões de francos-ouro. O novo país nasceu estrangulado por essa corda presa no pescoço: uma fortuna que atualmente equivaleria a US$ 21,7 bilhões ou a 44 orçamentos totais do Haiti atualmente. Muito mais de um século demorou para pagar a dívida, que os juros multiplicavam.

Em 1938, por fim, houve e redenção final.
Nessa época, o Haiti já pertencia aos bancos dos Estados Unidos. Em troca dessa dinheirama, a França reconheceu oficialmente a nova nação. Nenhum outro país a reconheceu. O Haiti nasceu condenado à solidão. Tampouco Simon Bolívar a reconheceu, embora lhe devesse tudo. Barcos, armas e soldados lhe foram dados pelo Haiti em 1816, quando Bolívar chegou à ilha, derrotado, e pediu apoio e ajuda. O Haiti lhe deu tudo, com a única condição de que libertasse os escravos, uma idéia que até então não lhe havia ocorrido.

Depois, o herói venceu sua guerra de independência e expressou sua gratidão enviando a Port-au-Prince uma espada de presente. Sobre reconhecimento, nem uma palavra.
Na realidade, as colônias espanholas que passaram a ser países independentes continuavam tendo escravos, embora algumas também tivessem leis que os proibia.

Bolívar decretou a sua em 1821, mas, na realidade, não se deu por inteirada. Trinta anos depois, em 1851, a Colômbia aboliu a escravidão, e a Venezuela em 1854.
Em 1915, os fuzileiros navais desembarcaram no Haiti. Ficaram 19 anos. A primeira coisa que fizeram foi ocupar a alfândega e o escritório de arrecadação de impostos.

O exército de ocupação reteve o salário do presidente haitiano até que este assinasse a liquidação do Banco da Nação, que se converteu em sucursal do City Bank de Nova York. O presidente e todos os demais negros tinham a entrada proibida nos hotéis, restaurantes e clubes exclusivos do poder estrangeiro. Os ocupantes não se atreveram a restabelecer a escravidão, mas impuseram o trabalho forçado para as obras públicas.
E mataram muito. Não foi fácil apagar os fogos da resistência.

O chefe guerrilheiro Charlemagne Péralte, pregado em cruz contra uma porta, foi exibido, para escárnio, em praça pública.
A missão civilizadora terminou em 1934. Os ocupantes se retiraram deixando no país uma Guarda Nacional, fabricada por eles, para exterminar qualquer possível assomo de democracia. O mesmo fizeram na Nicarágua e na República Dominicana. Algum tempo depois, Duvalier foi o equivalente haitiano de Somoza e Trujillo. E, assim, de ditadura em ditadura, de promessa em traição, foram somando-se as desventuras e os anos. Aristide, o cura rebelde, chegou à presidência em 1991.

Durou poucos meses. O governo dos Estados Unidos ajudou a derrubá-lo, o levou, o submeteu a tratamento e, uma vez reciclado, o devolveu, nos braços dos fuzileiros navais, à Presidência. E novamente ajudou a derrubá-lo, neste ano de 2004, e outra vez houve matança. E de novo os fuzileiros, que sempre regressam, como a gripe.
Entretanto, os especialistas internacionais são muito mais devastadores do que as tropas invasoras.

País submisso às ordens do Banco Mundial e do Fundo Monetário, o Haiti havia obedecido suas instruções sem pestanejar. Eles o pagaram negando-lhe o pão e o sal.
Teve seus créditos congelados, apesar de ter desmantelado o Estado e liquidado todas as tarifas alfandegárias e subsídios que protegiam a produção nacional. Os camponeses plantadores de arroz, que eram a maioria, se converteram em mendigos ou emigrantes em balsas. Muitos foram e continuam indo parar nas profundezas do Mar do Caribe, mas esses náufragos não são cubanos e raras vezes aparecem nos jornais.

Agora, o Haiti importa todo seu arroz dos Estados Unidos, onde os especialistas internacionais, que é um pessoal bastante distraído, se esquecem de proibir as tarifas alfandegárias e os subsídios que protegem a produção nacional. Na fronteira onde termina a República Dominicana e começa o Haiti, há um cartaz que adverte: o mau passo. Do outro lado está o inferno negro. Sangue e fome, miséria, pestes… Nesse inferno tão temido, todos são escultores.

Os haitianos têm o costume de recolher latas e ferro velho e, com antiga maestria, recortando e martelando, suas mãos criam maravilhas que são oferecidas nos mercados populares.
O Haiti é um país jogado no lixo, por eterno castigo à sua dignidade. Ali jaz, como se fosse sucata. Espera as mãos de sua gente. (IPS/Envolverde)

Eduardo Galeano é jornalista e escritor uruguaio, autor de mais de quarenta livros, que já foram traduzidos em diversos idiomas, como "O Livro dos Abraços" e "As Veias Abertas da América Latina". Suas obras transcendem os gêneros literários, combinando ficção, jornalismo, análise política e História.

17 de janeiro de 2010

Antes dos orixás


Por Luis Nicolau Parés

Na Bahia do século XIX, o termo mais habitual para designar as divindades africanas era “vudum” ou “santo vudum” e não orixá, o termo equivalente iorubá.

Os cultos aos voduns, originários da área gbe na África Ocidental (que corresponde à região dominada pelo antigo reino do Daomé, atual República do Benin), tiveram um papel determinante na formação do Candomblé baiano e do Tambor de Mina maranhense.

Na Bahia e no Maranhão os escravos provenientes da área gbe foram conhecidos como jejes, enquanto os seus vizinhos de fala iorubá, originários de terras localizadas na atual Nigéria, foram conhecidos como nagôs. Já na própria África, devido a uma longa historia de contato cultural, havia grandes semelhanças entre os cultos aos orixás e os cultos aos voduns. No Brasil, Nina Rodrigues, notando a “íntima fusão” dessas tradições, qualificou as suas práticas religiosas como “jeje-nagô”. Embora o termo “fusão” pareça excessivo, convém notar que muitos dos termos hoje usados nos candomblés nagôs, angolas e outros, são de origem gbe, ou seja, próprios dos candomblés jejes.

Por exemplo, os nomes dos noviços no grupo iniciático, “dofono” ou “fomo”; do altar ou santuário, “peji”; do quarto dos iniciados, “huncó” ou “runco”; da maceração de folhas com água, “amasi”; dos tambores, “rum”, “rumpi” e “runle”; da vareta percusiva, “aguidavi”; do agogô sagrado, “gã”; e do cargo masculino “ogã”, seriam todas palavras jejes. Esses termos referem-se a aspectos da “estrutura profunda” do ritual, como processos de iniciação, hierarquia do grupo, espaço sagrado e instrumentos, e revelam a importância que a tradição do culto aos voduns desempenhou no processo formativo das religiões afro-brasileiras.

Além dessa significativa influência lingüística, foram os cultos aos voduns que provavelmente forneceram no Brasil setecentista as primeiros referências para a organização do grupo religioso numa estrutura eclesial ou conventual. O tipo de devoção desenvolvida a partir da consagração de devotos às divindades através de processos de iniciação e da instalação de altares fixos em espaços sagrados estáveis contrastava com as práticas terapêuticas e oraculares de caráter mais individualizado, próprias da maioria dos calundus coloniais. Aliás, o culto de várias divindades num mesmo templo era prática comum nas tradições vodum africanas, desde pelo menos o século XVIII. Assim, a reunião e celebração conjunta de divindades de origens distintas nos terreiros afro-brasileiros, que alguns consideram uma “invenção” americana resultante do encontro multi-étnico gerado pela escravidão, encontraria também nos cultos aos voduns um modelo de organização que teria sido reproduzido por variados grupos africanos com suas divindades particulares.

Apesar dessa notória influência histórica, na virada do século XIX as tradições jejes perderam visibilidade frente àquelas dos cultos aos orixás dos nagôs. O processo de “nagonização” do Candomblé iniciou-se, sobretudo, no período pós-abolição, coincidindo com a gradativo desaparecimento dos africanos entre a população negra no Brasil.

No entanto, embora em número reduzido, uma série de congregações religiosas tem perpetuado o culto de certos voduns originários da área gbe. No Maranhão é famosa a Casa das Minas, e na Bahia são conhecidos, entre outros, os terreiros Bogum – de Salvador – e o Seja Hundé – de Cachoeira –, ambos fundados no século XIX. Essas casas ainda em atividade são emblemas contemporâneos de uma presença muito mais significativa no passado. Foi precisamente a partir da especificidade do culto aos voduns praticado nesses terreiros, em contraste com o culto às divindades iorubás e angolas (orixás e inquices, respectivamente), que no contexto religioso foi construído o conceito de “nação jeje” para designar um culto ou rito diferenciado.

A Casa das Minas, em São Luís do Maranhão, também conhecida como Querebentã Zomadonu, foi fundada por volta de 1840 sob a liderança de Maria Jesuína, africana consagrada ao vodum Zomadonu, dono espiritual da Casa. Pesquisas realizadas por Pierre Verger sugerem que a fundadora desse templo teria sido a rainha Nã Agontimé, viúva do rei Angonglo (1789-1797) do Daomé, vendida como escrava pelo rei Adandozan (1797-1818), que governou após o falecimento do pai e que foi destronado pelo meio irmão Guezo (1818-1858), filho de Nã Agontimé. Guezo organizou uma embaixada às Américas para procurar a sua mãe. Independentemente de ser Maria Jesuína a mesma Na Agontimé, o que parece claro é que na constituição do terreiro maranhense participaram especialistas religiosos associados à família real daomeana, e isso porque lá se preservam, como em nenhum outro templo no Brasil e provavelmente nas Américas, fortes traços do culto aos antigos reis e príncipes do Daomé, ancestrais divinizados que no Benim são conhecidos como Nesuhue.

O vodun Zomadonu, por exemplo, é tido no Benim como filho do rei Acabá e como chefe dos tohosus ou “reis das águas”, categoria dos Nesuhue que inclui os espíritos dos filhos reais nascidos com alguma anormalidade ou deformidade física. O panteão da Casa maranhense se organiza em três grupos principais: a família de Dambirá, a família de Quevioçô e a família real ou de Davice que, além de Zomadonu, inclui os voduns dos reis Daco-Donu, Acabá (Koisi-Acabá) e Agajá (Doçu-Agajá). O rei Agonglo (Agongono), o último membro da dinastia daomeana conhecido no Brasil, pertence à família de Savaluno, um dos grupos hóspedes das três famílias principais.

O paralelismo entre o culto da Casa das Minas e o culto aos ancestrais Nesuhue se evidencia também em vários aspectos da atividade ritual, como a estrutura da iniciação das vodúnsis (devotas do vodum) que, em ambos os casos, se dividia em dois estágios. O primeiro consistia numa iniciação “simples”, na qual a vodúnsi adquiria o grau de vodunsi-he. Porém, era no segundo estágio da iniciação, celebrado só a cada vários anos, que a vodúnsi virava vodúnsi gonjaí (ou vodunsi hunjayi nos Nesuhue), o status mais alto só alcançado pelas devotas de mais experiência e idade. Só as vodúnsi gonjaí podiam receber, além do seu vodum, uma segunda entidade espiritual, a chamada tobosi, uma princesa menina, e só a vodunsi gonjaí podia assumir a função de noché ou chefe da casa.

A última iniciação para “graduar” novas vodunsi gonjaí na Casa das Minas foi celebrada em 1914 com 18 vodúnsis, mas com a morte dessas mulheres e a partir dos anos 1960, as tobosi deixaram de manifestar-se. Essa interrupção crítica da iniciação das gonjaí, atribuída, entre outras razões, à falta de recursos econômicos e a erros rituais, tem comprometido seriamente a continuidade da Casa que, na atualidade, conta com um reduzido número de vodúnsis em idade bastante avançada. Contudo, a Casa das Minas tem exercido uma notável influência nos terreiros de Tambor de Mina e deve ser considerada uma das matrizes dessa instituição religiosa. Por exemplo, as tobosas, moças ou princesas seguem manifestando-se em muitas das casas de fundação mais recente. Como emblema da resistência da cultura negra e em reconhecimento da sua importância histórica e religiosa a Casa das Minas foi tombada pelo IPHAN em 2002.

Já na Bahia, embora os voduns jejes possam encontrar correspondências com os orixás nagôs, eles constituem uma categoria de entidades espirituais diferenciada. No rito jeje-mahi dos terreiros de Salvador e Cachoeira, além de voduns como Aizan (associado aos ancestrais) ou Aziri Tobosi (associada às águas), há três grandes panteões: a família de Kaviono ou Heviosô (associada ao trovão e ao fogo), a família de Azonsu ou Sakpata (associada à terra e a varíola) e a família de Dan (associada à cobra e ao arco-íris). As famílias baianas de Heviosô e de Azonsu correspondem grosso modo às famílias maranhenses de Quevioçô e de Dambirá, respectivamente. Porém, no rito jeje da Bahia destacam os voduns associados às cobras – que são Bessem, Dangbe, e Toquem, apenas conhecidos no Maranhão –, enquanto a Casa das Minas, como vimos, se distingue pela proeminência da família real de Davice, um panteão desconhecido na Bahia.

Uma comparação entre o culto jeje-mahi da Bahia e o mina-jeje do Maranhão revelaria que diferenças nos panteões e outros aspectos litúrgicos derivam não apenas da dinâmica sócio-histórica de cada contexto regional, mas também da especificidade étnica dos especialistas religiosos responsáveis pela transferência atlântica dos cultos. Os jejes provinham de várias províncias ou “terras” e pertenciam a etnias distintas – mahi, savalu, fon, mudibi –, cada uma com devoção por grupos de divindades específicos. Por exemplo, o aristocrático culto aos Nesuhue era exclusivo dos fons, enquanto os cultos a voduns como Hevioso, Sakpata ou Dan eram “públicos” e transétnicos. Esses panteões, que já na África funcionavam como cultos de múltiplas divindades, foram agregados ou justapostos no Brasil em cultos cada vez mais plurais e abrangentes.

Apesar das diferenças regionais, a identidade das divindades enquanto voduns e a língua ritual – inscrita nos cantos, preces, saudações, benções e terminologia religiosa – constituem os principais características da nação ou rito jeje. Outras especificidades aparecem nos ritmos de tambor, nas danças, nos emblemas das divindades, no vestuário, e também nos processos de iniciação. Todavia o fator diferencial jeje aparece nos rituais. A nação jeje-mahi da Bahia, por exemplo, caracteriza-se pela festa do boita – uma das obrigações mais importantes e concorridas do calendário anual, na qual os voduns desfilam em volta dos atinsa ou árvores sagradas –, e pela cerimônia do zandro que consiste na invocação das divindades para anunciar-lhes a celebração das oferendas animais no dia seguinte. O rito jeje-mahi também se caracteriza por compartilhar com os angolas certos rituais iniciáticos que não são praticados no rito nagô-ketu, como o gra - uma prova realizada no mato - ou a quitanda das iaôs - a venda de frutas realizada pelas noviças no fim da sua iniciação.

Podemos concluir, portanto, que particularidades dos cultos aos voduns originários da área gbe determinaram em grande parte a singularidade da nação jeje, mas tal identidade étnico-religiosa também foi resultado de um diálogo com outras tradições afro-brasileiras concorrentes. Nesse sentido, embora silenciada pelos estudos afro-brasileiros, a contribuição dos cultos voduns à formação das religiões afro-brasileiras parece ter sido mais influente do que é normalmente reconhecido.


Luis Nicolau Parés é professor do Departamento de Antropologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e autor de A formação do Candomblé: história e ritual da nação jeje na Bahia (Unicamp, 2006).

14 de janeiro de 2010

De qual religião pertence o Estado brasileiro?


Por Willian Luiz da Conceição

A história da formação do Brasil, assim como a dos países de colonização espanhola e portuguesa tiveram ao longo dos anos imposições culturais que de certa maneira permanecem arraigada em nosso cotidiano. Essa imposição cultural acontece de várias maneiras, inclusive no âmbito religioso.

A maior população católica do mundo, ou seja, a brasileira não se formou por acaso. Religião “oficial” durante mais de cinco séculos, contribuiu para o processo de colonização do europeu, buscando ser a “única” força religiosa em nome de Deus, não só no Brasil, mas em quase todo novo mundo.

Este processo não ocorreu de forma pacifica, pois ao chegarem encontram povos indígenas com diversas práticas religiosas, tidas como pagãs pelos conquistadores e por tanto devendo ser combatidas. Num processo de étnocídio em nome da cristianização de milhões de cativos. Isso ocorre de forma semelhante com as religiões de matrizes africanas, perseguida, criminalizada e marginalizada, motivo ainda hoje de muito preconceito.

O “confronto” etnocultural que se deu no Brasil, tardiamente nos garantiu o avanço de nos formalizarmos como nação laica, sem caráter religioso, onde o Estado deve respeito às diversas práticas religiosas que compõem a espiritualidade brasileira. Num país que se constituiu como uma verdadeira colcha de retalho cultural.

Mas, somos na realidade um país verdadeiramente laico? Não!

Apesar da conquista histórica garantida por diversos movimentos sociais, religiosos, etno-culturais na constituição brasileira de 1988, constituímos um país com grande preconceito religioso, onde as próprias instituições tidas como democráticas possuem práticas anticonstitucionais e desrespeitosas, como obtenção de símbolos religiosos em repartições públicas, como prefeituras, câmaras de vereadores, fóruns entre outros.

Além do nosso calendário possuir grande quantidade de datas católicas como feriados, garantindo um certo discurso de unidade nacional que não existe, negando a diferença cultural formadora desta nação.

Até quando seremos capazes de nos intitularmos um país democrático e de liberdade religiosa? Se não somos capazes de garantirmos o mínimo de qualquer país laico. O respeito!

Willian Luiz da Conceição é acadêmico do Curso de História e militante do PSOL/SC.

8 de janeiro de 2010

A democracia de fachada


Por Willian Luiz da Conceição

O Brasil é ainda hoje, um país de hegemonia política e econômica apoiada pela exploração da pobreza. O direito ao voto não garantiu ao Brasil ser estruturalmente uma democracia étnica, social, econômica e política.

A construção do Brasil se deu durante quase quatro séculos através da exploração da mão de obra de negros, permeada da utilização de mão de obra assalariada de colonos pobres em algumas regiões do país. O trabalho livre e o fim da escravidão não garantiu ao longo dos anos a ascensão social, políticas e econômicas do negro e dos indígenas.

A miscigenação garantiu o forte preconceito das elites pela grande massa da população brasileira.
Falsear uma democracia, onde a maioria da população brasileira não tem acesso a saneamento básico, água tratada, trabalho digno, saúde e educação, reforça a tese que a democracia do voto não mudou a estrutura social de um país elitizado desde os primórdios da colonização.

Eleger um presidente nordestino, ex-operário ou um vereador negro não garantiu aos trabalhadores, nem aos negros a efetivação de bandeiras históricas de sua classe. Isso por que a estrutura do poder é complexa e ditada pelas mesmas forças reacionárias e conservadoras que sempre governaram este país.

Assim como no romance de Monteiro Lobato o “Presidente Negro” a vitória de um negro no país mais desenvolvido do mundo não garantiu as melhorias necessárias a aquele grupo social. No romance a “democracia racial” só pode ser efetivada com a destruição do próprio negro, este interesse das elites efetivou-se no governo eleito pelos próprios negros.

Isso vem ocorrendo no Brasil, elegemos um presidente ex-sindicalista que fortalece a estrutura das desigualdades entre pobres e ricos. Suas ações assistencialistas, aprovada e permitida pelo orçamento pelos ricos não resolve os problemas históricos que permeiam a vida cotidiana da maioria dos brasileiros, como o acesso a terra.

Assim como eleger um vereador negro que jamais pontuou as dificuldades dos afro-descendentes numa cidade que nega a história dos mesmos. Cidade que publiciza em seu discurso a formação e os esforços de desbravadores germânicos, negando a contribuição de outras etnias e de dezenas de negros escravizados na sua formação.

Isso comprova que um ex-operário pode trabalhar para os patrões e um negro trabalhar a serviço das elites que negam ser brasileiros e que constroem sua história desconstruindo outras.


Willian Luiz da Conceição é acadêmico de História e militante do PSOL Joinville.

1 de janeiro de 2010

O desafio pedagógico de formar professores para promover a igualdade racial na escola


Por Lucimar Rosa Dias


MERGULHO NAS PROFUNDEZAS DO (NÃO) SABER...
Em 2002, Antônia Lucivânia da Costa Silva, aluna de pedagogia, solicitou-me que respondesse a algumas "perguntinhas" sobre racismo e educação, essas fariam parte de atividades de uma disciplina do curso.

As perguntas eram complexas e me proporcionaram pensar na minha experiência como professora, nas experiências de outras professoras que compartilhei, na minha pesquisa de mestrado e em tudo que sei e que não sei sobre essa questão.

Fiz um mergulho profundo durante dias e quase me afoguei procurando respostas definitivas para questões complexas e não totalmente resolvidas, quando fui obrigada a enfrentar as limitações de meus conhecimentos como pesquisadora e estudiosa da área, a aluna queria as respostas para concluir seu trabalho, prometi-lhe que em dois dias as entregaria.Tive que tirar a cabeça fora da água para tomar um pouco de ar e enfrentar as "perguntinhas". E, quando não se sabe por onde começar, o melhor é, como diz o dito popular "começar pelo começo", portanto, vamos às perguntas:

1-Como o preconceito racial afeta uma criança?

2-Como um educador das séries iniciais pode abordar o assunto "racismo" em sala de aula tendo alunos negros em sala?

3-Hoje, encontramos várias crianças negras em sala de aula e estas têm atitudes racistas. Como poderemos trabalhar pedagogicamente com essa questão? Como um educador pode abordar o assunto racismo tendo alunos negros em sala de aula?

4-Quais são os maiores problemas enfrentados nas escolas em relação ao racismo?

5- Existem nas escolas projetos relacionados com as crianças negras?

Talvez, as perguntas de Lucivânia, como prefere ser chamada, sejam as mesmas de outras pessoas que estão na escola, por isso, resolvi respondê-las como texto para compartilhar com mais pessoas minhas angústias, minhas dúvidas e minhas provisórias certezas sobre questões relativas as relações raciais na educação. Esse espírito de pedagoga-militante me faz acreditar que não devemos perder nenhuma oportunidade para contribuir com o desafio de formar professoras para trabalhar com a igualdade racial em sala de aula.
Optei por construir um texto no formato de perguntas e respostas. Portanto seguiremos, agora, por ordem as perguntas.

TURBULÊNCIAS EM ALTO MAR... ou de como é difícil enfrentar a diversidade. Pergunta nº 01: "Como o preconceito racial afeta uma criança?"

Em primeiro lugar a pergunta nos dá a oportunidade de definir alguns conceitos importantes que geralmente aparecem quando discutimos sobre relações raciais. São eles: preconceito racial, discriminação racial e racismo. Muitas vezes não os diferenciamos ou não sabemos exatamente o que de fato cada termo quer dizer.

Quando falamos de preconceito estamos nos referindo a idéia preconcebida, sem razão objetiva ou refletida. Por exemplo: pensar que as pessoas negras são pouco afeitas aos estudos e mais destinadas a trabalhos manuais é uma idéia preconceituosa, porque não está de acordo com a realidade e atinge a todo um grupo de pessoas. O fato de uma, ou outra pessoa negra não gostar de estudar não pode ser aplicado a todo o grupo racial.

Já a discriminação racial é uma atitude ou uma ação que objetiva diferenciar, distinguir e em geral prejudicar um grupo tendo por base idéias preconceituosas. Por exemplo: quando uma professora não permite que uma menina negra represente uma princesa em uma peça de teatro argumentando que as princesas são brancas, ela está discriminando negativamente, porque está praticando uma ação que objetiva prejudicar uma criança devido ao seu pertencimento racial.

E por fim, o conceito de racismo. Muitas pessoas dizem que o racismo no Brasil afeta: pessoas negras, pobres, indígenas, gordas etc. Certamente essas pessoas querem dizer que esses grupos também são discriminados e não que sofrem em decorrência do racismo, pois no conceito de racismo está presente a idéia de que existem raças superiores e inferiores e que disso decorrem a opressão de um grupo racial sobre outro, legitimando as desigualdades sociais, econômicas, escolares etc. Por isso, quando falamos que a pessoa gorda tem problemas de aceitação social, não estamos falando do mesmo fenômeno que desumaniza a pessoa negra ou indígena. Um caso se refere à discriminação e outro as conseqüências do racismo.

Bem feita essa distinções de conceitos tentarei responder a primeira pergunta a partir de dois momentos vividos por mim em situações de ensino em Campo Grande/MS. O primeiro ocorrido quando era estagiária do curso normal em 1983 numa escola pública municipal e o segundo em 2002 em uma oficina para crianças de 3 a 14 anos em uma comunidade negra urbana chamada São João Batista.

Momento 1

-Posso me sentar ao seu lado? -pergunta-me uma linda menina negra de cabelos trançados e seus sete anos.
-Claro, mas por que quer sentar-se aqui? - pergunto-lhe intrigada, já que sou a única adulta na sala de aula da 1ª série e há vários grupos de crianças pela sala.
- É que você é a única igual a mim- disse-me, voltando seus olhos para a sua pele.

Momento 2

Discutimos, após a leitura do livro O Menino Marrom do Ziraldo, como era a discriminação na escola. Várias crianças relataram que sofriam com os xingamentos, o deboche sobre o cabelo, etc. praticado pelos seus colegas da escola.

A partir dos relatos perguntei-lhes o que poderíamos fazer para eliminarmos essas situações. Elas indicaram várias possibilidades: contar para a diretora, para a professora, para a mãe, dar "porrada" e fingir que não ouvia. Depois que falaram, propus que desenhassem no chão as alternativas apresentadas e outras que lembrassem. A maioria repetiu o que foi dito. Questionei com as crianças que desenharam as ações violentas se de fato essas eram boas alternativas, algumas resolveram apagar essa alternativa, outras decidiram mantê-la dizendo que era a única que resolvia. Terminada essa atividade, voltamos ao grupão para finalizar a oficina. Fizemos uma avaliação dos trabalhos daquela tarde, os adolescentes, principalmente, disseram que gostaram do livro porque eles se sentiam bonitos como o menino marrom, etc, fizeram muitas brincadeiras do tipo. Tudo corria bem e já íamos terminar o trabalho quando...

" - Lucimar - puxa minha saia uma pequerrucha de seus seis anos".
- Diga. Qual é o seu nome?
- Sara.
- O que foi, Sara?
- Na minha escola, as crianças vivem me chamando de cabelo de bombril.
- AH! Muito bem! - falando com a turma toda - O que nós combinamos que faríamos quando isso acontecesse?

- A gente fala com a professora! - respondem todos.
-Viu, Sara, quando acontecer novamente, você deve falar com a sua professora.
- Mas, Lucimar, eu já falei um monte de vezes e ela nem ligou!
Calei-me por alguns minutos diante da dura realidade e me senti impotente por alguns minutos. Depois, pensamos em algumas ações com base no que Sara relatou. Surgiu a idéia de conversar com a mãe dela, com a coordenação e com a diretora da escola.

Esses dois acontecimentos, um ocorrido há mais de 15 anos, outro, em 2002 nos dão a dimensão de como o preconceito racial está presente na vida escolar e nos permite inferir algumas conseqüências negativas, para as crianças negras, advindas dele. Tais como: rejeição, desvalorização, sentimento de solidão. Podemos também, baseados na produção científica, principalmente, das décadas de 80 e 90 dizer que o preconceito racial interfere drasticamente no rendimento escolar das crianças negras.

Essas conseqüências do racismo serão vivenciadas de diferentes maneiras. Tudo depende do instrumental que a criança possui para enfrentá-las. Se tiver uma família com condições de conversar sobre isso para ajudá-la a construir sua autoconfiança ela percorrerá esse árido trajeto escolar e sobreviverá aos efeitos de ser discriminada. Ou ainda, se encontrar algum suporte oferecido pela escola para enfrentar a discriminação podemos dizer que não sairá ilesa desse processo mas que pode construir possibilidades de reação às situações e com isso permanecer na escola obtendo sucesso.

A família e a escola são espaços sociais com grande potencial para produzirem as resistências ao racismo, a discriminação e preconceitos, mas em sua maioria, ainda, não estão cumprindo esse papel. O que logicamente é compreensível, pois são instituições sociais permeadas pela ideologia do racismo.

As famílias negras possuem extrema dificuldade para melhorar seu capital social, cultural e econômico, pois o racismo não opera apenas em nível individual, ele é estruturante da sociedade brasileira e as crianças negras são herdeiras da desigualdade e da exclusão social provocadas pelo racismo institucional brasileiro.

A escola tem sido um espaço privilegiado onde as crianças negras aprendem sobre rejeição nas intensas interações que ali se dão quase sempre negativas. Geralmente a discriminação racial na escola se dá pela aparência: é o cabelo, a pele, o nariz, enfim são os atributos físicos os escolhidos pelos discriminadores para depreciarem o negro. Em muitos casos a criança incorpora essa depreciação evitando sua identidade negra e tudo que a remeter a ela. E as professoras nem sempre reagem pedagogicamente a essas situações discriminatórias. Segundo Jurandir Freire Costa:

Para que o sujeito construa enunciados sobre sua identidade de modo a criar uma estrutura psíquica harmoniosa, é necessário que o corpo seja predominantemente vivido e pensado como local e fonte de vida e de prazer. (...) A partir do momento em que o negro toma consciência do racismo, seu psiquismo é marcado com o selo da perseguição pelo corpo-próprio. Daí por diante, o sujeito vai controlar, observar, vigiar este corpo que se opõe à construção da identidade branca que ele foi coagido a desejar. A amargura, desespero ou revolta resultante da diferença em relação ao branco vão traduzir-se em ódio ao corpo negro. (1983:6)

É possível, portanto, inferir que mesmo às crianças negras que possuem um suporte psíquico-socioafetivo para enfrentar o racismo, seja ele proporcionado pela família ou pela escola, não é sem dor que enfrentam as situações discriminatórias, que lhes dificultam a vida escolar, afetam sua sociabilidade e seu rendimento. O enfrentamento e a superação do racismo demandam das crianças negras um esforço muito grande para crescer como cidadãos e cidadãs saudáveis. Essa situação convoca a todos os educadores e educadoras, comprometidos com uma sociedade melhor a atuar de imediato nessa área.

A idéia de que as crianças precisam ser cuidadas e protegidas deve nos mobilizar a agir sobre essa realidade, não podermos deixar que Saras- a menina do momento 2- busquem sozinhas soluções para problemas tão graves. Essas crianças têm produzido, solitariamente, inúmeros jeitos de resistências no âmbito escolar que muitas vezes não são consideradas como resistência e ai vem os rótulos de: crianças agressivas, com baixa capacidade de concentração etc.

Para compreender melhor as relações raciais, BENTO (2002) tem apontado a necessidade de discutir para além de como o preconceito, o racismo e a discriminação afetam a criança negra. Diz Bento que é necessário discutir o legado branco dessa relação. A população branca de qualquer nível social tem tido privilégios que não se quer discutir. Se de um lado temos a desvalorização da identidade negra, temos de outro à valorização da identidade branca. Segundo Bento, "O privilégio simbólico e concreto da brancura". Se de um lado há crianças que aprendem a não se gostar, temos de outro, aquelas que aprendem a se gostar e portanto, uma séria reflexão sobre essa temática em sala de aula não poderá esquecer que negros e brancos são afetados pelo preconceito, discriminação e racismo de maneiras diferentes trazendo desvantagens para o primeiro e vantagens para o segundo grupo.

NAVEGAR ENTRE CHUVAS E TROVOADAS... ou de como se enfrenta a diversidade em sala de aula. PERGUNTA Nº 02. "Hoje, encontramos várias crianças negras em sala de aula e estas têm atitudes racistas. Como poderemos trabalhar pedagogicamente com essa questão ? Como um educador das séries iniciais pode abordar o assunto "racismo" em sala de aula, tendo alunos negros em sala?"


Bem, aqui temos um problema conceitual. Não é adequado considerar racista a criança negra que rejeita a sua identidade ou manifesta qualquer reação negativa em relação a esse assunto. Ela não pode ser caracterizada como racista. É muito comum ouvirmos a frase: "mas o próprio negro é racista, ele não se aceita como negro." Ao fato de não se aceitar como negro, chamamos de introjeção do preconceito racial, isto é, a pessoa negra aceita a idéia de inferioridade atribuída a sua condição racial e para livrar-se disso nega-se como negra. E isso jamais pode ser considerado uma atitude racista. Se assim o fosse, estaríamos culpando a vítima pelo crime. Ser racista implica, ser o opressor, ter o poder de subjugar, ter a hegemonia simbólica ou concreta da situação. E é isto quem herda são as pessoas brancas. De acordo com Maria Aparecida Silva Bento (2002),

Na verdade, o legado da escravidão para o branco é um assunto que o país não quer discutir, pois os brancos saíram da escravidão com uma herança simbólica e concreta extremamente positiva, fruto da apropriação do trabalho de quatro séculos de outro grupo. Há benefícios concretos e simbólicos em se evitar caracterizar o lugar ocupado pelo branco na história do Brasil. (2002. P. 27).

No caso em que estamos discutindo quem herdou benefícios das relações raciais estabelecidas no Brasil não foram as crianças negras. Elas são vítimas da opressão racial da sociedade, por isso jamais são racistas. Porém, apesar do equívoco conceitual na pergunta, a questão principal que ela contém precisa ser respondida. Qual seja: Como um educador deve trabalhar o racismo, ou melhor dizendo, o combatê-lo em sala de aula, inclusive com crianças negras em sala?
Imagino que deva haver uma infinidade de caminhos para responder a essa questão. Meus estudos, por enquanto, me permitem dizer que abordar o racismo em sala de aula não deve ser diferente quando se tem ou não crianças negras. A questão principal é o professor se preparar para o tema. É necessário estudar. Tenho dito que professores estão acostumados à idéia de que, para ensinar matemática, português ou geografia etc. ela tem que estudar, mas quando quer abordar temas como racismo, nem sempre se preocupa em estudá-lo, conta com o que sabe do senso comum. Isso é um problema, pois assim ele pode incorrer em graves erros conceituais e metodológicos.

Também é necessário compreender que o educador fará sua parte no processo de desconstrução de conceitos e preconceitos, mas não resolverá toda as dimensões do problema que é social. Ter essa consciência lhe dá tranqüilidade para enfrentar os muitos desafios que aparecem no trato dessa questão na escola.

Há muitas formas de abordar o tema: palestras, trabalhos monográficos, teatro, música, poesias, leitura de textos, histórias, brincadeiras. A escolha da metodologia mais adequada depende da idade dos alunos, da série em que se encontra, do tempo que se tem, do conteúdo a ser trabalhado. O fundamental é que o professor queira contribuir para a diminuir o preconceito instalado na sociedade brasileira, esse dever ser o principal objetivo pedagógico.

Tenho incentivado os professores com os quais trabalho a incluir o tema da igualdade racial em seus currículos a partir de um projeto de trabalho. Para Hernandez,

A função do projeto é favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares em relação a: 1) o tratamento da informação, e 2) a relação entre os diferentes conteúdos em torno de problemas ou hipóteses que facilitem aos alunos a construção de seus conhecimentos, a transformação da informação procedente dos diferentes saberes disciplinares em conhecimento próprio. (1998:64)

Para escrever um projeto é necessário refletir sobre o assunto, dependendo da idade dos alunos, discutir com eles, além de levantar bibliografia, solicitar ajuda, enfim fazer um planejamento detalhado.

Construímos, no caso da educação infantil, uma metodologia para iniciar o trabalho. Esse trabalho está disponível, no formato de cartilha publicada pelo movimento pró-creches comunitárias de Belo Horizonte e na minha dissertação de mestrado Essa metodologia tem servido de base às professoras da educação infantil que desejam iniciar um trabalho com essa temática e não sabem como fazê-lo. A metodologia tem como pressuposto

(...) o reconhecimento da diferença, com o objetivo de inverter o processo que tende a associar tal reconhecimento aos estereótipos negativos. Ou, em outras palavras, o reconhecimento da diferença deve ser construído no sentido da 'valorização' e posterior 'naturalização' dessa diferença, para que a igualdade subjacente seja ressaltada". (VALENTE. 1995.p.44).

A aplicação da metodologia, a fim de atender seu pressuposto, prevê a utilização dos seguintes materiais: flores de mesma espécie e cores diferentes, animais da mesma espécie e cores diferentes, papel e lápis de cor e o livro de Ana Maria Machado, "Menina Bonita do Laço de Fita."3

A apresentação é feita em forma de surpresa, levam-se as flores e os bichos que são apresentados separadamente. Primeiro, as flores, que devem estar embrulhadas para que as crianças adivinhem o que o pacote contém. Depois, as crianças devem identificar semelhanças e diferenças (tamanho, cores, tipo etc.). Exploram-se todas as possibilidades de uso das flores e suas necessidades para viver (água, terra, sol etc). O procedimento com os animais é o mesmo tanto para apresentar, como no momento de explorar semelhanças e diferenças e necessidades para viver. A idéia é que as crianças compreendam que independente da cor das flores as possibilidade de uso e as necessidades para viver são as mesmas, assim como os animais. Uma forma de proceder está descrita no relato abaixo retirado da minha dissertação de mestrado.

"Apresentamos inicialmente três embrulhos. Cada um continha uma rosa diferente. Havia uma rosa vermelha, uma branca e uma cor-de-rosa. Solicitava-se das crianças que adivinhassem o que continha cada um deles. O conteúdo do primeiro embrulho demorou mais tempo para ser descoberto, já o do segundo foi rápido, pois perceberam que em todos havia rosas. O clima de surpresa ficou por conta de adivinhar a cor da rosa escondida.

Toda vez que acertavam a cor da rosa, retirávamos o papel e conversávamos sobre aquela flor. Perguntamos para que servia a rosa cor-de-rosa. Eles sugeriam várias alternativas: servia para enfeitar a casa, para dar às mães, para colocar no caixão, para plantar, para dar de presente, para enfeitar casamentos, para dar ao (a) namorado (a), por no cabelo, etc.

E assim fizemos com a rosa vermelha e com a rosa branca. Concluímos com eles, que mesmo mudando a cor da rosa, as funções delas continuavam a ser as mesmas. Era possível enfeitar a casa, dar à mãe ou colocar em caixão qualquer uma delas. Eles concordaram, com cara de como é que podíamos estar questionando algo tão óbvio como este!

Após essa atividade, colocamos as rosas dentro de um vaso e dissemos que havia outra surpresa para eles, mas só a mostraríamos se também adivinhassem o que era. Tínhamos dentro de uma caixa de sapatos três pintinhos: um branco, um preto e um marrom.

Eles demoraram mais a advinhar o conteúdo da caixa. Todos queriam falar ao mesmo tempo e ninguém estava acertando. Sugerimos a eles que fizessem bastante quietos. Ao fazerem silêncio ouviram os pintinhos piando e gritaram alegremente o que continha na caixa.

Dissemos que só lhes seriam mostrados quando acertassem as cores dos pintinhos. Cada vez que acertavam, retirávamos o pintinho da caixa. A sala de aula virou uma "bagunça", todos queriam pegá-los. Foi necessário voltá-los para a caixa e combinar com os alunos que deixaríamos os pintinhos andarem livremente pelo círculo e que só depois é que poderiam tocá-los . (DIAS,1997: 60).

É claro que essa é apenas uma das formas de abordar a temática do racismo em sala de aula, serve como uma possibilidade para quem quer começar e não sabe por onde. A aplicação da metodologia prevê ainda, desenhos de pessoas negras e brancas feitos pelas crianças antes e depois da atividade com as flores e os animais. É bom que o/a professor/a converse com as crianças durante a produção dos desenhos para identificar quem são as pessoas que elas estão desenhando e qual a cor/raça de cada pessoa desenhada. Na conversa é possível captar muito do que elas trazem de conceitos e preconceitos sobre a temática em questão. O trabalho é finalizado com a leitura do livro "Menina Bonita do Laço de Fita".

O desenvolvimento das atividades deve fazer parte de um projeto de trabalho, isso é o que dará caráter pedagógico ao trabalho. Uma atividade pedagógica, como disse, requer planejamento, objetivos claros bem como organização no tempo e no espaço da escola. O volume 10 dos PCN- Parâmetros Curriculares Nacionais, Pluralidade Cultural e Orientação Sexual, contém boas noções de como podemos fazer um trabalho nessa área. Nessa temática, o comprometimento da/o professor/a em promover a igualdade racial é o fundamental.

Um bom projeto de trabalho ou projeto didático como alguns chamam, deve seguir algumas etapas, mas não é um processo estático, ele é dinâmico e gradual. E talvez seja desnecessário dizer, mas deve ser um material escrito. Não há possibilidade de desenvolver um projeto didático se ele estiver apenas na cabeça do/a professor/a.

Há três momentos distintos, mas interelacionados na construção de um projeto didático. O primeiro é a escrita do projeto propriamente dito pelo professor, vamos chamá-lo de esboço. Nele deve ter as respostas para as seguintes questões: 1- O que pesquisar? Definição do tema; 2- Por que pesquisar? Justificativa; 3- Para que pesquisar? Objetivos; 4-Quando fazer? Duração; 5-Onde fazer? Local; 6-Com o que fazer? Recursos; 7- Como fazer? Metodologia ; 8- Quem participa? Todos os envolvido e 9- Que resultados esperar?

Produto. No caso das relações raciais há inúmeras possibilidades de investigação, como já disse anteriormente depende da série, da idade, do tempo, etc. Se os alunos são pequenos o melhor é que o/a próprio/a professor/a escolha o tema e pense em estratégias para criar o interesse no grupo.

Por exemplo: Uma temática presente no currículo da educação infantil é o estudo do corpo. A partir desse tema o/a professor/a pode discutir questões pertinentes a temática das relações raciais. É sempre a partir de uma questão que damos início a um projeto. No nosso exemplo o professor poder escolher um livro ou uma brincadeira que suscite nas crianças a seguinte pergunta : "Por que as pessoas não são iguais?".

O segundo momento é o de compartilhar com os alunos o esboço do projeto. É um momento muito importante, pois o propósito de utilizar essa metodologia é também de proporcionar ao aluno, de todas as idades e séries, o domínio desse instrumento de trabalho.

Cada questão deverá ser discutida com os alunos. É uma oportunidade para chegar se a temática de fato desperta interesse ou se querem acrescentar novas questões etc.

O terceiro momento é o relatório do projeto que deve ser feito paralelamente. Cada etapa deve ser descrita com detalhes. Como os alunos reagiram à escolha do tema? Como foi a definição dos detalhes do projeto? Quem participou e como participou? Quais os resultados mais importantes.

É fundamental que o professor consiga registrar os resultados dos diferentes momentos do trabalho para que possa avaliar os resultados e repensar sua prática, só assim é possível trabalhar pedagogicamente temas como o que estamos discutindo.

E como muita água ainda vai rolar... Começo a responder a quarta pergunta. Quais são os maiores problemas enfrentados nas escolas em relação ao racismo?

A escola é uma instituição social, portanto, o racismo não está fora de seus muros, ele entra nela como entram todas as questões sociais (desigualdades, violência etc). Acredito na escola como espaço da contradição, assim, como temos pessoas que reproduzem as relações discriminatórias, temos pessoas que desejam superá-las. Por isso um dos problemas mais graves a enfrentar será a oposição nem sempre explícita dos setores da escola, seja ele docente, discente ou administrativo. Apesar desse trabalho estar respaldo na lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino da História da África e da Cultura dos afro-brasileiros e dos PCN a questão em jogo é ideológica, há os querem manter a sociedade com negros e outros grupos sendo inferiorizados e os que querem mudar essa realidade, por isso, não se pode desanimar diante dos primeiros problemas que aparecerem.

Outra questão importante é, em alguns casos, a falta de apoio dos sistemas educacionais (secretarias de ensino) para os professores que desejam atuar neste tema.

Penso que esses são os problemas mais sérios dos quais decorrem outros, a falta de material, as muitas metodologias que precisam ser criadas para abordar determinados temas e conceitos envolvidos nesse trabalho, a dificuldade para lidar com as emoções que são mobilizadas nesse tipo de atividade etc.. Nenhum desses problemas impedem que professores comprometidos com a promoção da igualdade racial na escola desenvolvam bons trabalhos. Nos grupos de formação de professores com essa temática é possível verificar como são ricos os relatos das experiências vividas por quem já entrou nesse barco. Muitos professores contam com felicidade inúmeras situações pedagógicas nas quais sentiram orgulho por terem se arriscado a trabalhar com esse tema, perceberam suas crianças mais felizes, grupos de alunos mais coesos e solidários com isso se sentiam muita mais responsáveis em seu papel de educadores. Acredito realmente que educar para a igualdade racial é um risco que vale a pena.

CONSTRUINDO BARCOS PARA NAVEGAR ou experiências bem sucedidas nessa trajetória.
Pergunta nº 05: Existem nas escolas projetos relacionados com as crianças negras?

O resultado do I Prêmio Educar para a Igualdade, promovido pelo CEERT-Centro de Estudos das Relações de Trabalho e pela Prefeitura de São Paulo em 2002 é um bom indicativo de que as coisas não estão paradas. Foram recebidos 210 projetos com a temática, grande parte eram de trabalhos voltados para o combate à discriminação contra o negro.

Também como exemplo caseiro temos o projeto: Construindo uma prática de promoção da igualdade racial a partir da bibliografia afro-brasileira da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.

Várias secretarias de educação incluíram em seu organograma equipes responsáveis pela tarefa de disseminar a idéia de promoção da igualdade racial. Posso citar como exemplos: a secretaria estadual do MS, a secretaria municipal de Campinas, a secretaria de Belo Horizonte, a secretaria municipal de Belém, entre outras.

Esses são exemplos de uma gama de ações sempre gestadas pela força da militância negra em todo o país. Há muita coisa sendo realizada por todo o Brasil. Para a realização de uma educação anti-racista e promotora da igualdade é necessário:

1-Sentir-se motivado para mudar uma realidade na qual ela está mergulhada querendo ou não;

2- Estabelecer alguns contatos, sempre há na cidade em que se mora um grupo ou pessoas que atuam com essa temática e elas geralmente serão fontes de apoio;

3- Dar visibilidade ao trabalho realizado além da sala de aula, com ações simples como: a) convidar uma personalidade da cidade ou mesmo do bairro para conhecer seus alunos e o que estão fazendo; b) expor os trabalhos dos alunos, redações, desenhos, etc na escola e também em outro lugar da cidade e/ou do bairro (por exemplo a mercearia mais visitada do bairro);

4- Incluir na escola a imagem da diversidade racial brasileira. Em cartazes, atividades de destaque como teatro, festas comemorativas e ações semelhantes;

6- Tentar atrair outras pessoas da escola para seu projeto. Pessoas dos diferentes níveis da organização da escola como: a merendeira, a faxineira, a secretaria, a diretora, outra/a professora/a, dando lhes papéis de destaque. Por exemplo estabelecer um dia para que os alunos escrevam cartas, bilhetes para diretora da escola contando o que estão fazendo e convidando-a para ir até a sala de aula, enaltecendo sua importância na escola ou levar desenhos para a merendeira e contar o que estão fazendo, oferecer uma música para secretaria que tenha relação com o tema trabalhado. Isso envolve outras pessoas no trabalho e cria uma expectativa positiva sobre o mesmo.

Fundamental é que o trabalho não seja para a criança negra mas para todas as crianças. Obviamente que cada professor deve encontrar a melhor maneira de fazê-lo e isso, a melhor maneira, vai acontecendo a medida que o educador se arrisca nesse mergulho. Não deve ser um mergulho desprotegido, ao contrário, o educador deve cercar-se de cuidados para poder enxergar todas as possibilidades que este novo empreendimento pode lhe proporcionar.

São medidas simples de segurança;
1)leia pelo menos um texto sobre o assunto,
2) não se envergonhe de perguntar para alguém que considere saber algo sobre o assunto;
3) não deixe de exigir da coordenação da escola apoio ao seu trabalho;
4) exija da sua secretaria de educação o cumprimento das leis que respaldam essas ações;
5) E a mais importante: compartilhe suas angústias é assim que a gente cresce, é assim que a gente aprende e certamente é assim que mudamos uma realidade para melhor.

BIBLIOGRAFIA:

ARTHUSO, Edna Rodrigues. Sou Preta da Linda Cor, cartilha, Movimento de Luta Pró-creches, jul, 2001, Belo Horizonte, MG.
COSTA, Jurandir Freire. Da cor ao corpo: a violência do racismo. In: Sousa, Neusa Santos. Tornar-se Negro. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1983.88p.
BENTO, Maria Aparecida da Silva (org ). Branqueamento e branquitude no Brasil. In: Corone, Iray, Bento, Maria aparecida da Silva, Psicologia Social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Petrópolis, RJ, Editora Vozes, 2002.189p.
DIAS. Lucimar Rosa. Diversidade Étnico-racial e Educação Infantil. Três Escolas. Uma questão. Muitas Respostas, Dissertação de Mestrado, UFMS, 1997.
GANDIN, Adriana Beatriz. Metolodogia de projetos nas sala de aula; relato de uma experiência. Coleção Fazer e transformar. São Paulo, SP: Edições Loyola, 2001.
MARTINS. Jorge Santos. O trabalho com projetos de pesquisa: do ensino fundamental ao ensino médio. Campinas, SP: Papirus, 2001.
VALENTE, Ana Lúcia E. F. Proposta metodológica de combate ao racismo nas escolas. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n.93, p.40-50, maio/95.